12 de junho de 2016

Curiosidades sobre o estupro no Brasil até 2005

No Brasil, até pouco tempo, uma "aberração" relativa ao estupro era permitida, como é, ainda hoje, em alguns países do Oriente Médio.  

O criminoso (estuprador) ficaria isento de pena (extinguia a punibilidade) se se casasse com a vítima ou um terceiro o fizesse!
Código Penal 1940

Parece absurdo, mas é a pura verdade!  

Até 2005 vigorou no Brasil os dispositivos do Código Penal (Decreto 2.848/40), artigo 107, incisos VI e VII, os quais foram revogados pela Lei 11.106/2005 - esses dispositivos permitiam tal absurdo.  

Felizmente, com a vigência da referida Lei eles perderam a validade, e nós, mulheres, passamos a ser "livres" da imposição de nossos pais e da "vontade luxuriosa" de certos indivíduos aproveitadores (criminosos).

Imagine ter que se casar um sujeito que te violou; um "tarado" asqueroso, só para preservar a "honra" e ficar livre da exposição? Muito pior que morrer solteira e virgem! 

Mas, a verdade é que os dispositivos revogados (que permitiam o casamento da vítima com o agressor) não foram pensados no bem da mulher (na vítima), eles foram elaborados para beneficiar o agressor que se livraria da pena ao se casar com a vítima ou se um terceiro o fizesse (funcionava como uma  VERGONHOSA reparação)!

Não importa o que digam: se algum pai permitiu tal barbaridade coadunou com uma lei injusta, elaborada por um Parlamento injusto e sem noção!

Por isso que sempre repetimos a máxima: "nem sempre o legal é justo, nem sempre o justo é legal"!

Além da possibilidade de estuprador se casar com a vítima e extinguir a punibilidade dele havia, também, a possibilidade dele se livrar da pena se um terceiro o fizesse!  

É inacreditável ler isso e não ficar pasma e INDIGNADA! 


Como é possível elaborar um dispositivo assim?  Interpreto como sendo uma "pena para a vítima" e um prêmio para o estuprador; pois, se ela fosse menor (entre 16 e 18 anos) e os pais consentissem o casamento, teria que conviver com o violador como esposo (se fosse ele a desposá-la e não um terceiro)!

Quando leio dispositivos asquerosos assim minha mente viaja! 

"Fico imaginando uma bela moça nos idos de 2000 que, todavia, fosse homossexual.  Ao ser violentada por certo indivíduo, o pai que já era homofóbico, preconceituoso, intolerante se aproveitaria disso para obrigá-la a casar com qualquer um, inclusive com o próprio criminoso se este se dispusesse!  No entanto, se aparecesse outro rapaz que quisesse desposá-la (e ela ainda fosse "incapaz", ou seja, menor) estaria, a pobre coitada, condenada no lugar do criminoso, pois TERIA DE FAZER ALGO QUE NÃO QUERIA e ainda assim estaria livrando o deliquente da punição merecida!

Viajaram comigo nessa possibilidade apresentada? Ainda bem que ela não existe mais.

Sobre os questionamentos apresentados acima citarei as transcrições do artigo 107 do Código Penal na época em questão; vejam:

Os incisos VII e VIII do art. 107 do Código Penal estabeleciam como causas de extinção da punibilidade o casamento da vítima com o agente e o casamento da vítima com terceiro, respectivamente.

Conforme o texto revogado do inc. VII do art. 107 do Código Penal, a punibilidade seria extinta: 


“pelo casamento do agente com a vítima, nos crimes contra os costumes, definidos nos Capítulos I, II, e III do Título VI da Parte Especial deste Código”.

Nos termos do revogado inc. VIII do art. 107 do Código Penal, também seria extinta a punibilidade: 


“pelo casamento da vítima com terceiro, nos crimes referidos no inciso anterior, se cometidos sem violência real ou grave ameaça e desde que a ofendida não requeira o prosseguimento do inquérito policial ou da ação pena no prazo de 60 (sessenta) dias a contar da celebração”.

As disposições acima transcritas abrangiam os crimes de estupro, atentado violento ao pudor; posse sexual mediante fraude, atentado ao pudor mediante fraude, sedução, corrupção de menores e rapto (arts. 213 a 221 do CP), sendo imprescindível observar as ressalvas legais que determinavam limitações ao alcance das regras.

Impunha-se a extinção da punibilidade em razão da reparação pelo casamento. Entendia-se que o matrimônio limpava a honra da vítima manchada pelo crime, constituindo, em tese, razão suficiente para a terminação dos questionamentos judiciais acerca dos fatos.

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Que tipo de "limpeza de honra" era essa que isentava criminoso de pagar pelo crime da forma merecida (na cadeia)?  Não acredito que o legislador tenha pensado muito para elaborar uma lei assim - ou se pensou não tinha filhas ou se tinha, não pensou nelas!

Por Elane F. de Souza (Advogada e Autora deste Blog - ao copiar cite a fonte)



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